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sexta-feira, 8 de maio de 2009

ORDENAMENTOS JURÍDICOS EM CONCORRÊNCIA

Wegner, Gerhard. Instituições nacionais em concorrência. Trad. Urbano Carvelli. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2007.
Os tempos que ora correm, em que se pretende a superação das soberanias estatais em prol da conversão do mundo em um grande mercado regulado exclusivamente pelo que os agentes econômicos decidirem livremente em seus contratos – a denominada lex mercatoria - , mostram a oportunidade da publicação desta obra do eminente Professor da Universidade de Erfurt. O problema da convivência de diferentes tipos de regulamentação da economia entre os Estados participantes da União Européia e seus efeitos sobre a concorrência entre os agentes econômicos no âmbito daquela Comunidade Internacional, e, fora desta, no âmbito das relações internacionais econômicas, rastreando as discussões que se travaram no âmbito dos foros internacionais acerca dos limites e possibilidades do estabelecimento de uma autoridade que assegurasse a concorrência internacional, as relações que se estabelecem entre os produtos e serviços migrando de uma concorrência baseada exclusivamente nas características intrínsecas a eles para uma concorrência entre regimes jurídicos, os efeitos das regulamentações tanto na restrição às possibilidades de decisão dos agentes econômicos como no subministrar elementos para a tomada de decisões, tais são alguns dos temas que são versados nesta obra, que dialoga constantemente com as teses do denominado Ordoliberalismo, corrrente de pensamento jurídico e econômico voltada a adaptar a visão liberal clássica aos tempos posteriores à II Guerra, reagindo ao intervencionismo, na qual se destacam nomes como Walter Eucken e Friedrich August von Hayek. A questão da adequação da concorrência entre as instituições exteriores ao mercado, de tal sorte que umas podem ser mais conformes às preferências dos destinatários dos ordenamentos do que outras, revela, aqui, no pensamento do autor que ora se resenha, uma outra faceta da relação entre a economia e o Direito, no sentido de que esta mesmo passa a ser visto como um artigo de consumo – os agentes econômicos buscam os ordenamentos que se mostrem menos restritivos em questões como relações trabalhistas, consumo, meio ambiente, os consumidores, por seu turno, encontram na regulamentação uma possibilidade maior de obterem as informações acerca dos bens e serviços a serem adquiridos -, o que, modo certo, não deixa de trazer outros temas recorrentes, como o da tendência da concorrência entre instituições se colocar em sentido oposto à da concorrência econômica, ou seja, se esta tende à concentração, aquela tende à perpetuação e, por outro lado, a própria negociação em torno do ordenamento a ser escolhido para reger as transações realizadas no mercado, como tem sido comum nos contratos internacionais dotados de cláusula de arbitragem. Claro que, de certo modo, não deixa de se mostrar algo chocante o tratamento dos ordenamentos jurídicos como artigos de consumo, postos à negociação no mercado: contudo, não se pode negar que tal ponto de vista, dentre os juristas, sequer constitui novidade, porquanto na doutrina do Direito Internacional Privado tem sido recorrente a tese da possibilidade de as partes escolherem o ordenamento jurídico que deverá reger a solução das controvérsias que se instaurarem em torno de seus contratos. Por outro lado, a tendência a perpetuação da concorrência entre os ordenamentos jurídicos – não só as vicissitudes do MERCOSUL como as da própria União Européia ilustram tal assertiva – vem a traduzir um contraditor nada desprezível à idéia de homogeneização do espaço jurídico econômico que se pretende nominar como globalização. Em suas oitenta e oito páginas, a obra vem a se mostrar uma das mais vivas explicitações do acerto da frase de Bobbio quanto a não ser bastante sustentar a prevalência do econômico para merecer a qualificação de marxista. Em que pese a concisão, vários temas são versados na obra ora resenhada, como se pôde ver, abrindo caminhos para um sem-número de pesquisas para quantos tenham interesse nos temas da concorrência, da globalização e da formação de Comunidades Econômicas.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

O DENOMINADO “DIREITO ANTITRUSTE” NA ORDEM ECONÔMICA

GOMES, Carlos Jacques Vieira. Ordem econômica constitucional e direito antitruste. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2004.

O autor, mestre em Direito pela Universidade de Brasília, concebendo o Direito Econômico como conjunto de regras e princípios voltados à implementação de políticas sociais e econômicas, destaca o direito antitruste como a parcela daquele ramo do Direito voltada à implementação de políticas públicas voltadas ao controle, preventivo ou repressivo, do exercício do poder econômico. Manifestando preferência pela denominação "direito antitruste" ao invés de "direito da concorrência", o texto procura identificar as relações entre o controle do abuso do poder econômico e os princípios que embasam a ordem econômica, na realização dos seus escopos econômicos e sociais. O referencial teórico do autor está na Análise econômica do Direito, o que explica a ênfase em conceitos como eficiência econômica e na própria regra da razão, cuja adoção pela jurisprudência norte-americana muito deve a Richard Posner, corifeu daquela escola.

A obra se mostra profundamente interessante, pelos dados que aporta para o exame da repressão ao abuso do poder econômico em face da Constituição Econômica como um todo.

Esposando a distinção estabelecida por Pierre Devolvé entre princípios jurídico-econômicos liberais e intervencionistas e aplicando-a aos desdobramentos do artigo 170 da Constituição Federal, o autor considera que o controle do exercício abusivo do poder econômico está voltado, efetivamente, à implementação de políticas públicas voltada não só à tutela da livre iniciativa e da livre concorrência, mas também à promoção do pleno emprego, à tutela da soberania nacional, à defesa do consumidor, enfim, à realização dos princípios da ordem econômica.

Considera, mais, que o controle do exercício do poder econômico é que constituiria a base constitucional da ação antitruste e não a tutela da livre concorrência, dado que, a seu ver, a livre concorrência implicaria a ausência do poder econômico (a rigor, o que ela implicaria, na realidade, seria a igualdade de forças entre os agentes econômicos) e, por outro lado, se fosse nela que se embasasse a ação antitruste, todos os atos concentracionistas, mesmo que não se mostrassem abusivos, estariam vedados.

Ainda, toma em consideração o dado de que a menção posta no § 4º do artigo 173 da Constituição Federal é de caráter puramente exemplificativo e não taxativo, pois, do contrário, estariam permitidas formas de abuso que não tivessem por escopo aqueles declinados no aludido dispositivo, e não se poderia conceber que exatamente o uso para além dos limites jurídicos pudesse ficar ao largo da atividade repressora.

Distingue, ainda, entre o controle preventivo e o controle repressivo do abuso do poder econômico.

Aponta, como escopos econômicos da ação antitruste, a defesa da concorrência, a tutela da eficiência econômica, a tutela do consumidor e a proteção às empresas de pequeno porte.

Como seus escopos sociais, indica a valorização do trabalho, o pleno emprego e a redução das desigualdades regionais.

Como escopos políticos, indica a soberania econômica, o interesse nacional e a integração dos mercados regionais.

Indica, ainda, exemplos concretos no que tange às possibilidades de se atender a cada um dos escopos referidos.

É de ser salientado, entretanto, que em muitos pontos não encontra convergência com o signatário da presente resenha, porquanto dá ao Direito Econômico um objeto muito amplo - a política educacional, que, em si mesma, não constitui capítulo da política econômica, embora ninguém a exclua do conceito de política social, acaba sendo incluída como objeto do Direito Econômico -, e, por outro lado, ainda não conseguiu este resenhante superar as razões que o levam a não admitir o direito antitruste – principalmente quando se tem em vista a realidade da experiência da unificação da Alemanha, cuja política se deu num sentido de estimular a concentração empresarial, num rumo bem diverso, portanto, daquele seguido nos EUA -, bem como as que o conduzem a algumas incompatibilidades com a Análise econômica do Direito.

Por outro lado, nota-se que somente em se adotando uma concepção mais ampliativa do conceito de abuso do poder econômico, para além da tutela da concorrência – como, de nossa parte, fazemos – é que se poderá concordar com o asserido acerca de se voltar a ação estatal voltada a reprimi-lo à concreção de todos os princípios da ordem econômica, a cada vez que a situação de pujança econômica vier a atingir objetivos incompatíveis com os valores constitucionalmente albergados.

A distinção, outrossim, entre escopos econômicos, escopos sociais e escopos políticos não me parece das mais adequadas, porque, ao cabo, implica negar que as questões concernentes ao trabalho e ao desequilíbrio regional constituam objeto de política econômica – o que não é verdade, dado que o trabalho é, tradicionalmente, um dos fatores da produção, e que o desequilíbrio regional tem fortíssimas relações com a própria integração dos mercados regionais -, e, por outra parte, termina por descaracterizar o econômico enquanto manifestação do social e as decisões econômicas enquanto manifestação de poder, logo, políticas. Mas tal distinção, entretanto, é compreensível, dado que se costuma considerar que o interesse da economia é absolutamente estranho, em si mesmo, ao bem-estar social e seria algo que se oporia à política.
Mas estas divergências não chegam a afetar o valor da obra em si mesma, que está a pedir exame e debate em cada uma das proposições.

REGULAÇÃO E CONCORRÊNCIA

FONSECA, Antônio [org.]. Limites jurídicos da regulação e defesa da concorrência. Porto Alegre/Brasília: Sérgio Antônio Fabris/Fundação Pedro Jorge - Escola Superior do Ministério Público da União, 2003.

Mais uma importante contribuição traz o editor Sérgio Antônio Fabris para o preenchimento das lacunas existentes no Brasil quanto à bibliografia dedicada ao estudo do Direito Econômico. Efetivamente, conta títulos valiosos dedicados a esta disciplina - do Prof. Werter Faria (Constituição Econômica - liberdade de iniciativa e concorrência, Direito da concorrência e contrato de distribuição), do Prof. Washington Peluso Albino de Souza (Lições de Direito Econômico), do Dr. Sérgio Ribeiro Muylaert (Estado, empresa pública, mercado), do Prof. Paulo Henrique da Rocha Scott (Direito Constitucional Econômico: Estado e normatização da economia), do Prof. Fernando S. Fabris (Concentrações empresariais e o mercado relevante) e ainda a obra coletiva Desenvolvimento econômico e intervenção do Estado na ordem constitucional - estudos jurídicos em homenagem ao Prof. Washington Peluso Albino de Souza -.
A obra coletiva que estou a resenhar - fruto da atuação do organizador, membro do Ministério Público Federal e Professor da UnB junto à pós-graduação desta instituição de ensino superior - merece o título de valiosa.

No presente momento, em que um certo modismo em torno das agências de regulação vem conduzindo um discurso laudatório por parte de alguns juristas encantados com tudo o que se faz no estrangeiro e em que a reflexão parece banida em nome do objetivo de nos mostrarmos dignos de sermos chamados "juristas de primeiro mundo" - mentalidade colonial que não foi extirpada apesar do 7 de setembro de 1822 -, os trabalhos que compõem o volume ora resenhado traduz uma honrosa exceção, contribuindo para acicatar esta atividade que tende à atrofia: falo da reflexão, do debate, da angústia por não se encontrar a solução definitiva para absolutamente nada.

O estudo introdutório, de autoria do organizador da obra, Professor Antônio Fonseca, toca no problema da liberdade de iniciativa, posta como fundamento da República no inciso IV do artigo 1º e assegurada como direito fundamental pelo artigo 170, caput, ambos da Constituição Federal brasileira de 1988, assegurado o desenvolvimento da concorrência como mecanismo de funcionamento daquela e a regulação, para possibilitar o equilíbrio entre o uso público dos bens ofertados, por um lado, e a eficiência econômica, por outro.

O texto da Dra. Débora Capp enfrenta o tema do papel do direito de propriedade industrial no contexto da defesa da concorrência - notadamente numa época em que esta tem de ser pensada num plano que extrapassa os limites das fronteiras dos Estados soberanos -, assinalando especificamente a função social com que os grava a Constituição de 1988 como desdobramento do princípio da supremacia do interesse público ante o interesse individual, para centrar suas atenções nos problemas que circundam especificamente a patenteabilidade dos produtos farmacêuticos, por dizerem respeito a interesses coletivos maiores, como a saúde, a cultura e o meio ambiente.

Já o trabalho da Dra. Jaqueline Mainel Rocha versa, a partir da constatação de que, com a privatização e a transferência da execução de atividades que tradicionalmente se consideravam típicamente serviços públicos à iniciativa privada, emergiu a necessidade de o Poder Público exercer o que a doutrina denomina, hoje, regulação, a adequada compreensão desta sem a acrítica importação de conceitos provenientes de sistemas jurídicos diversos, só se pode fazer a partir da utilização do conceito de discricionariedade técnica, em que mediante, os critérios ofertados pelas diversas especialidades em que se manifesta o conhecimento técnico-científico, a autoridade oferta a melhor solução no completar os parâmetros postos na regra atributiva de competência para normatizar as relações jurídicas concernentes ao setor regulado.

O Dr. Leonardo de Brito Seixas Neves enfrenta o tema do conflito de atribuições entre o Banco Central do Brasil e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, delimitando o campo de atuação de ambas as autarquias, uma, de defesa da concorrência, a outra, de regulação do sistema financeiro nacional, explicitando as competências para dirimir os conflitos de atribuições entre órgãos integrantes de Poderes diversos, cometida ao Judiciário, e para dirimir os conflitos de atribuições entre órgãos integrantes da estrutura de um mesmo Poder, cometida ao Chefe respectivo, olhos postos, ainda, na solução posta no Parecer GM 020, da Advocacia Geral da União, concernente à competência exclusiva do Banco Central em se tratando da apreciação de atos de concentração relativos ao Sistema Financeiro Nacional.

O Prof. Antônio Fonseca examina o delicado tema dos acordos de cooperação - designados pelo anglicismo pool - e suas finalidades, assinalando a necessidade da disciplina e fiscalização por parte das autoridades antitruste e reguladora, quando for o caso, centrando sua atenção nos pólos petroquímicos e, mais especificamente, no Pólo Petroquímico Sul - integrantes de um setor antes em regime de monopólio público, entregue à iniciativa privada sem preocupações com a concorrência -, tratando-os como uma universalidade de direito.

A obra finda com um comentário a três decisões do CADE concernentes a temas de concentração de empresas em setores regulados, a saber, setor financeiro e telecomunicações, extremando as atuações de defesa de concorrência e de regulação, bem como a necessidade de uma atuação integrada entre as autoridades encarregadas de uma e de outra tarefa.